quarta-feira, 25 de julho de 2012

O pecado da usura foi revogado e ninguém chiou


Acima, uma das imagens que apareceram quando digitei
"Ulisses Guimarães" no Google, em julho de 2012


A constituição de 1988 tentou perpetuar o que já estava em vigor antes dela: um limite numérico para o pecado da usura. Como não pegaria bem o texto legal de um estado constitucionalmente laico falar em "pecado", usaram seu equivalente secular, que se chama "crime".

O curioso é que, na cara dura, o tal artigo foi extinto, extirpado, apagado, como se não houvesse mais fé no maior país católico do mundo. Não houve uma única manchete de jornal, nem aqui nem no Vaticano, dando a notícia: "Pecado da usura é revogado no Brasil". Enfim, uma pouca-vergonha.

Veja como era em 1988:
Artigo 192:
§ 3º - As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar.
Veja como ficou em 2003:
Emenda Constitucional Nº 40, de 29 de maio de 2003
Artigo 192:
§ 3°- (Revogado)

Revogado!!! Que gracinha!. Se fossem mais moderninhos, diriam: "Deletado!", ou "Fui!".

Bem, eu tive conta bancária e cheque especial em 1988 e nos anos seguintes. Lembro que os bancos cobravam juros colossais acima da inflação, todos os dias, em qualquer esquina, em todos os rincões do país, o que aliás fazem até hoje. Ou seja, cometiam o crime e o pecado da usura a céu aberto. Não sou eu que estou dizendo que era crime. Foi a Constituição de 1988.

Mas não me lembro de ver TODOS os donos de banco perseguidos como chefes do tráfico em operações especiais das tropas de elite. Nunca os vi escondidos em bunkers nas favelas, mas sim protegidos em mansões com segurança máxima montada às avessas: para evitar a entrada de bandidos e não a saída deles. Também nunca vi um banqueiro ser expulso de uma igreja, salpicado de água benta, sob berros de "Sai, Satanás!".

Nada disso. As taxas de juros cobradas pelos bancos eram divulgadas e discutidas alegremente na TV. Sob a letra da lei, isso é equivalente a reconhecer como normal se todo o dia o Jornal da Globo anunciasse a cotação da cocaína junto com a taxa de juros do cheque especial (nesse caso, a palavra "especial", vamos combinar, é de uma comédia sem pudor).

Em 2003, quando os banqueiros finalmente tiveram a segurança institucional de governar o país (uma vez que os patetas do PSDB caíram fora e os petistas do PT caíram dentro, por incapacidade genética dos primeiros em anestesiar os sindicatos e o MST, o que passou a ser feito com perícia e eficácia só a partir de janeiro de 2003), o tal artigo caiu como maçã podre, apodrecida no pé.

Já fui alertado por amigos entendidos, como se isso me comovesse: "Peraí, essa lei nunca foi regulamentada, por isso não era aplicada!" Ok, mas, até onde entendi lendo as letrinhas que li, a tal constituição era clara como céu aberto: crime, crime, C-R-I-M-E. Ou seja, se o artigo não foi regulamentado, tanto pior. O crime é ainda mais grave.

Além disso, pergunto: se não precisava cumprir o artigo, por que então foi necessário revogá-lo? Por que os funcionários de banco que assinaram a revogação do artigo assim o fizeram? Fiz umas contas e concluí que era mais econômico, para os bancos, revogar a comédia do que subornar deputados e senadores ano após ano para que não o regulamentassem ou ameaçassem fazê-lo. Pagar à vista, os bancos sabem, é sempre melhor do que em prestações, razão pela qual sempre preferem receber em prestações, mesmo que arriscadas. Se forem muito arriscadas, basta transformá-las em derivativos.

Numa hora dessas, lamento mesmo é ser ateu, o que me faz não acreditar em inferno. Fervorosos católicos donos de banco, quando mortos, viram só comida de vermes, e o presidente da cínica Constituinte da época, apenas comida de camarões (animais onívoros sem o menor senso estético; imaginem comer o Ulisses Guimarães). Portanto, nenhum deles está ardendo em brasas em um dos círculos do inferno de Dante.

Se alguém aí tiver estômago forte, que leia abaixo o nome das criaturas que fazem esse tipo de coisa.


Mesa da Câmara dos DeputadosMesa do Senado Federal
Deputado JOÃO PAULO CUNHA
Presidente
Senador JOSÉ SARNEY
Presidente
Deputado INOCÊNCIO DE OLIVEIRA
1º Vice-Presidente
Senador PAULO PAIM
1º Vice-Presidente
Deputado LUIZ PIAUHYLINO
2º Vice-Presidente
Senador EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS
2º Vice-Presidente
Deputado GEDDEL VIEIRA LIMA
1º Secretário
Senador ROMEU TUMA
1º Secretário
Deputado SEVERINO CAVALCANTI
2º Secretário
Senador ALBERTO SILVA
2º Secretário
Deputado NILTON CAPIXABA
3º Secretário
Senador HERÁCLITO FORTES
3º Secretário
Deputado CIRO NOGUEIRA
4º Secretário
Senador SÉRGIO ZAMBIASI
4º Secretário

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