Pra mim há duas estirpes no futebol. Duas linhagens e o termo cai bem falando de um esporte, plataforma de savants. Mas também serve pra vida.
As duas linhagens são: os pelés e os garrinchas.
Os pelés são o Pelé, o Messi, o Cristiano Ronaldo e o Kaká. São objetivos, correm, driblam e avançam sem parar, até fazer o gol. Não desperdiçam energia com gracinhas. Fazem isso com genialidade mas sobretudo com eficiência e objetividade. São protagonistas de novela da Globo, são Sennas.
Os garrinchas são barrocos. São o Garrincha, o Maradona e, explico a seguir, o Neymar. Fazem palhaçadas, dão dribles lindos e inúteis. Querem divertir e divertir-se. São artistas de circo, que transformam adversários em "escada" de suas piadas corporais.
Meu amigo Claudio Mello Wagner (autor de "Futebol e Orgasmo", um belíssimo olhar reichiano sobre o futebol e a vida), me disse hoje que esse rascunho de pensamento fala sobre apolíneos e dionisíacos. Ele é um reichiano da melhor cepa, além de observador acurado do futebol.
O Neymar ainda é um mistério para todos, mas não para mim. É óbvio que ele é dionisíaco no DNA. Os torcedores e comentaristas e zagueiros idiotas falam que ele é cai-cai, mascarado etc. O único problema dele é que suas pernas são dionisíacas mas seus empresários são apolíneos. Não se sabe o que vai prevalecer.
Pra que servem os ídolos? Servem pra ser ídolos, e é só. Todo mundo civilizado sabe que são criaturas normais, mas todo mundo finge, em certos momentos pelo menos, que são "especiais", na bola, na guitarra ou nas pistas.
O fato de o Neymar ter um pai suspeito de maracutaias, tanto faz. O Michael Jackson, vamos combinar, teve um pai um tanto pior. E o fato de o Neymar até agora não ter se metido com drogas nem com uma vida completamente devassa (se eu tivesse a grana dele aos 20 anos, estaria morto há décadas) é uma questão de tempo. Nenhum dionisíaco é dionisíaco de verdade a não ser um pouco antes de morrer, desde que morra jovem, é lógico.
Torço pro Neymar ser genial na Copa e logo depois (depois, gosto de futebol!) se meter em enrascadas daquelas que a Amy Winehouse se envergonharia.
Isso vale para roqueiros, filósofos e todo mundo.